O fogo entra na rota de um caminhante francês pelo Brasil

Do Chuí ao Oiapoque: no meio do caminho, os incêndios em Minas Gerais
O início do caminho de Saint-Hilaire na região do Serro, MG. Foto: acervo pessoal.

 

O francês Johann Grondin, 46, decidiu percorrer, a pé, 8 mil quilômetros entre dois extremos do Brasil: Começou em Arroio do Chuí, no Rio Grande do Sul, e só vai terminar em Oiapoque, no Amapá.

 

 

A travessia dele começou em fevereiro passando pelo litoral dos estados do Sul do país até o litoral de São Paulo, uma etapa que levou quatro meses. Em julho, ele chegou à região Sul de Minas Gerais, passando pela Serra da Mantiqueira e caminhou até a Serra do Espinhaço, cordilheira que atravessa todo o estado até a Bahia.

“É uma natureza selvagem, com poucos traços do ser humano, encontro pouca gente, quase ninguém. É um lugar que merecia mais turistas”, disse Johann.

Na cidade histórica do Serro, porta do Vale do Jequitinhonha, Johann começou a percorrer o caminho feito por outro francês, há mais de 200 anos: o naturalista Auguste Saint-Hilaire. Ele narrou cada etapa para o Projeto Preserva, contando sobre as impressões e desafios que teve.

“Foi muito punk chegar a Diamantina, fiquei sem sinal do GPS e foi uma aventura de verdade, porque não tem sinalizações para os caminhos. Agora tenho que pensar bem meu trajeto até a próxima parada, que é o Parque Estadual de Biribiri.”

O caminhante francês Johann em Milho Verde, MG. Foto: acervo pessoal

O Caminho de Saint-Hilaire

A rota turística se inspirou num dos trajetos percorridos pelo naturalista francês em Minas Gerais, no século XIX. Auguste Saint-Hilaire viajou pelo Brasil entre 1810 e 1822 e, em Minas, fez diferentes percursos em cada visita. Um desses foi pela Serra do Espinhaço. Por isso, a rota tem início em Conceição do Mato Dentro e passa por 12 comunidades.

Johann relatou as belezas que encontrou na rota: comunidades, montanhas, rios.  No município do Serro, ele passou na fazenda Ouro Fino, onde Saint-Hilaire pernoitou e leu o texto que naturalista escreveu na época:

Região da fazenda Ouro Fino, no Serro, onde Saint-Hilaire pernoitou no século XIX. Foto: Johann Grodin

“Após transpor o Ribeirão dos Porcos e, em seguida, o Rio dos Peixes cheguei ao rancho do Ouro Fino, que era mantido por negros. Como já era tarde, decidi passar a noite ali, embora não estivesse a mais de uma légua da Vila do Príncipe (hoje, Serro). As pessoas da casa se juntavam, Manuele da Silva e os negros, em uma caravana que estava havia vários dias em Ouro Fino.” (Auguste Saint-Hilaire)

Ao refazer o caminho, em 2024, no mês em que a seca severa tomou conta do país, Johann também encontrou fogo e fumaça.  Os incêndios, que já se espalhavam pelo Norte e Centro Oeste do Brasil, se alastraram por Minas Gerais. Johann chegou a ajudar os brigadistas que encontrou pelo trajeto.

Johann Grondin ajudou brigadistas na Serra do Espinhaço. Foto: acervo pessoal

“Vi fogo em na Serra do Cipó, em Biribiri, no Parque Nacional Sempre-Viva e, agora que estou em Grão Mogol. Não tem fogo, mas tem muita fumaça.”

Ele, que já mora há seis anos no Brasil, em Caeté, interior de Minas Gerais, notou que as nascentes perto de casa estavam secas este ano. Johann sabe que o clima favorece o incêndio, mas é a mão humana que ateia o fogo:

“Foi o ser humano que botou fogo, às vezes por falta de educação, para jogar uma bituca [de cigarro] e, também, soube de gente que queria limpar o pasto. Erro do ser humano.”

Johann agora segue rumo à Bahia e vai levar mais alguns meses até chegar ao Oiapoque, no Amapá.

 

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