O otimismo que cercou a divulgação do último RAD – Relatório Anual do Desmatamento no Brasil –, pelo MapBiomas, contrastou com o cenário demonstrado para a Mata Atlântica em Minas. Enquanto todos os biomas do país registraram queda no ritmo de desmatamento no ano passado, a Mata Atlântica foi o único destoou. O encolhimento do bioma, mesmo mantendo-se próximo da estabilidade, aumentou, registrando a supressão de 13.472 hectares em 2024, sendo que 13.212 ha haviam sido desmatados em 2023.
Dos 15 estados em que há Mata Atlântica no Brasil, Minas foi o que mais perdeu área do bioma: 5.352,37 hectares, 3% a mais que em 2023 (5.317,59 ha). Mais uma vez, pois o estado também liderou esse triste ranking no levantamento anterior, papel que vem exercendo há mais de 20 anos.
Minas Gerais tem quatro municípios entre os dez que mais perderam área de Mata Atlântica no país: Ninheira, Águas Vermelhas, Curral de Dentro e Araçuaí, onde, no início de maio, a Câmara Municipal aprovou um projeto de lei que pode reduzir à metade a Área de Proteção Ambiental (APA) Chapada do Lagoão, importante unidade de conservação da região. O projeto está em análise na Prefeitura, que tem até o dia 27 para sancionar a lei, segundo o gabinete do prefeito Tadeu Barbosa de Oliveira (PSD). O texto aprovado pelos vereadores possibilita uma redução de até metade da área de proteção.
Os maiores interessados na liberação da área protegida são os setores econômicos e políticos ligados à mineração do lítio. Em nome dela, tenta-se, inclusive, suprimir não só a vegetação e a água de uma região, mas sua própria identidade. Os simpatizantes da atividade já se referem ao local como Vale do Lítio, apagando o nome do rico, cultural e ambientalmente, Vale do Jequitinhonha. A área específica é de transição para o Cerrado e mostra que a voracidade do desmatamento não tem limites.

No geral, Minas foi o oitavo estado com o maior número de alertas de desmatamento emitidos em 2024 O número, 2.316, caiu 54,9% em relação ao registrado em 2023, com 5.138 alertas.
Além da Mata Atlântica, que cobre 40% do solo mineiro, a Caatinga, que ocupa 6% do estado, perdeu 5.175 hectares de sua vegetação no ano passado, segundo o RAD. E o Cerrado, maior bioma de Minas, presente em 54% do território, teve a supressão de 27.638 ha, concentrando 72,42% do desmatamento registrado no estado – a área mais devastada.
O Cerrado pelo Brasil
O Cerrado foi o bioma mais devastado no Brasil, pelo segundo ano consecutivo, segundo o relatório do MapBiomas. A área desmatada representou mais da metade do total registrado no país (52,5%), totalizando 652.197 hectares, mas 41,2% a menos que em 2023, que teve o recorde nos registros do RAD, com 1.109.850 ha.
O RAD concluiu que, nos últimos seis anos, o Brasil perdeu cerca de 9,88 milhões de hectares de vegetação nativa, sendo mais de 82,9% na Amazônia e no Cerrado. Em 2024, porém, o desmatamento no Brasil diminuiu em mais de 30% em comparação com 2023, totalizando 1,24 milhão de hectares. Quantos causas, o relatório aponta que a agropecuária é o principal vetor de pressão, com mais de 97% da perda de vegetação nativa nos últimos seis anos. Eventos climáticos extremos apresentaram o maior incremento relativo em 2024, diretamente relacionados aos impactos do desastre climático no estado do Rio Grande do Sul.
Pressão externa
Um outro fator de pressão é a nova regulamentação de importação de commodities da União Europeia (Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento ou European Union Deforestation-Free Regulation – EUDR), que pode gerar um efeito “rebote” no Cerrado. A norma, que já está em vigor, sendo que as exigências impostas às cadeias produtivas serão cobradas a partir de 31 de dezembro de 2025, proíbe a colocação no mercado europeu de produtos associados ao desmatamento e derivados de madeira que tenham sido indutores de degradação florestal.

Porém, há uma peculiaridade: o entendimento de desmatamento da EURD é baseado na definição de floresta da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), que considera áreas com árvores acima de 5 metros de altura e uma cobertura de copa superior a 10%, ou árvores com capacidade de atingir esta altura, e exclui formações não florestais, como ocorre no Cerrado. Pode haver, portanto, uma forte tendência de migração de atividades ligadas ao desmatamento de regiões amazônicas ou de Mata Atlântica para o bioma que já é o mais castigado no Brasil.
Na apresentação do relatório, houve um certo alívio quanto aos dados gerais de queda de desmatamento na maior parte do país. Mas o que não se pode esquecer é que ele continua. Num momento em que é preciso recuperar e incrementar as áreas de vegetação, festejar que houve uma queda na sua redução ainda é muito pouco.
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