Licenciamento ambiental em Minas: passa boi, passa boiada, passa trator

Sem zerar o desmatamento, como Minas alcançará a meta de Net Zero de emissões até 2050?
Área desmatada no Norte de Minas. Decreto do governo estadual facilita destruição ambiental | Foto: Projeto Preserva

 

Enquanto muita gente ficou alarmada com os danos que a aprovação do PL da Destruição pode provocar em âmbito nacional, Minas resolveu não ficar de fora e abriu a porteira para participar da farra da boiada: anunciou que propriedades rurais com até mil hectares serão dispensadas de licenciamento ambiental.

Passa boi, passa boiada, passa trator. A motosserra na legislação favorece os negócios do campo, nos curto e médio prazos, “tomando essas medidas para tornar a vida do produtor rural melhor”, de acordo com o governador de Minas Gerais, ao anunciar a mudança. A corrente do setor produtivo (destrutivo?) comemorou. Ambientalistas, e demais chatos que se preocupam com a vida e outras questões menores que o lucro, chiaram. O relaxamento nas leis prejudica o futuro do planeta – e do próprio agro, que depende de clima, água, vegetação, do meio ambiente que pretende degradar, para lucrar, ou, ao menos, sobreviver.

Mas é assim que acontece. Se é trabalhoso, “difícil”, e gera custos cumprir a lei de forma responsável, mude-se a lei! A legislação previa a dispensa de licenciamento para propriedades de até 200 hectares. Agora, o tamanho foi multiplicado por cinco.

Só para refrescar a memória, nesses tempos de aquecimento global e emergência climática, Minas foi o estado que mais suprimiu vegetação da Mata Atlântica em 2024, de acordo com o RAD – Relatório Anual do Desmatamento no Brasil –, publicado recentemente pelo MapBiomas. O desflorestamento, além de já causar emissões, diminui a capacidade de remoção de carbono. Ou seja, é como se subtraísse (a capacidade) duas vezes – ou se adicionassem duas vezes as emissões.

Uma consulta ao 4º Inventário de Emissões e Remoções Antrópicas de Gases de Efeito Estufa, o mais recente publicado pelo estado, em 2022, mostra que, em 2019, quase 6 milhões de toneladas de CO2 foram emitidas especificamente devido à supressão de florestas primárias para uso agropecuário. Por outro lado – e em sentido contrário –, a remoção de carbono total do estado ligada ao uso da terra foi de menos de 4 milhões de toneladas. A grosso modo, para cada duas árvores mantidas em pé, derrubamos três. Ou, a cada 2 metros quadrados (m²) de limpeza que fazemos em casa, sujamos 3 m².

De acordo com o inventário, o setor chamado de AFOLU (agropecuária, florestas, uso do solo) foi responsável por mais da metade (51%) das emissões brutas no período entre 2015 e 2019. Os outros setores são o de Energia (26%), IPPU (processos industriais e uso de produto), com 18%), e de Resíduos (5%). Dentro do AFOLU, a predominância das emissões é originada nas atividades de agropecuária.

O estado de Minas Gerais é signatário da campanha global Race to Zero. Em teoria, está comprometido com a neutralização de suas emissões de carbono até 2050. Mas, sem desmatamento zero (legal e ilegal), dificilmente (para não dizer impossível), chegará à meta de Net Zero (emissões líquidas iguais a zero) a que se comprometeu, medida fundamental para conter o aquecimento global e combater as alterações climáticas.

 


 

Artigo publicado originalmente na coluna do Projeto Preserva, no jornal Diário do Comércio

Receba a Veredas

Receba a Veredas

Receba a Veredas

Este site usa cookies para garantir que você obtenha a melhor experiência em nosso site. Ao acessar nosso site, você concorda com a nossa Política de privacidade e nossos Termos de uso atualizados. Mais informação